Lutero Descobre a Bíblia – Ferdinand Pauwels
Luther discovers the Bible (Luther entdeckt die Bibel / Luther a découvert la Bible / Lutero Descobre a Bíblia), 1872, Wilhelm Ferdinand Pauwels (German Belgian-born Academic Painter, 1830-1904), oil on canvas, 120 × 120 cm, Wartburg Foundation (Wartburg-Stiftung), Eisenach, Germany.
Ao celebrar a sua primeira missa, o jovem sacerdote Martinho Lutero tremia, pois não conseguia entender as palavras da missa enquanto um sacrifício a Deus. O temor de tal maneira tomou conta dele que mal pôde terminar o serviço religioso. A perfeita santidade de Deus era motivo de grande temor para Lutero. O Senhor exige santidade de todos aqueles que a ele se achegam, e Lutero reconhecia-se um pecador na presença de Deus. As provisões da confissão auricular (revelar seus pecados ao sacerdote e ouvir dele a pronúncia do perdão) e da vida monástica, fazendo boas obras para agradar a Deus, não aquietavam a sua alma. De fato, chegou mesmo a agasalhar em seu coração raiva de Deus, por este lhe inflingir tanta miséria.
Enquanto no mosteiro, Lutero começou o estudo sério de teologia. Dedicou-se ali à leitura das obras de Santo Agostinho e dos escolásticos. Por um lado, tais estudos só fizeram aguçar sua luta interior. Certa ocasião, ao vasculhar a biblioteca, encontrou, acidentalmente, um exemplar da Bíblia latina que jamais houvera visto antes. Esta atraiu poderosamente a sua curiosidade; leu-a ansiosamente e sentiu-se atônito ao perceber que apenas uma pequena porção das Escrituras era ensinada ao povo. Durante seu tempo no mosteiro, Johann Von Staupitz (ca. 1460-1524), teólogo e professor universitário alemão, vigário geral da Ordem Agostiniana na Alemanha e superior de Lutero, exerceu sobre este considerável influência, sendo-lhe o confessor. De fato, Lutero encontrou auxílio nos conselhos do piedoso Von Staupitz, que lhe aconselhou a confiar em Deus e a estudar a Bíblia.
Lutero viveu e estudou no mosteiro em Erfurt até 1511. Entretanto, por indicação de Von Staupitz, que reconhecia em Lutero uma erudição e inteligência incomuns, em 1508 ele foi designado professor na Universidade de Wittenberg, fundada em 1502 por Frederico, o Sábio, duque da Saxônia e presidente do conselho que elegia o imperador do Sacro Império Romano da Nação Alemã. Em Wittenberg, Lutero ficou no mosteiro agostiniano e, por um semestre, lecionou filosofia moral na Universidade ao mesmo tempo em que prosseguiu seus estudos de teologia, instruindo-se principalmente nas línguas grega e hebraica. A 09 de março de 1509 obteve o grau de bacharel em estudos bíblicos. Naquele mesmo ano, isto é, em 1509, Lutero retornou a Erfurt e passou a lecionar dogmática no Estudo Geral da Ordem.
Em sua tela, Ferdinand Pauwels retrata agora Lutero em seu uniforme de hábito preto, e com a tonsura característica dos monges do mosteiro agostiniano. Lutero encontra-se na biblioteca, e, de pé, examina ávida e atentamente o grande livro. Ele manuseia com as duas mãos a Bíblia e o olhar está devidamente direcionado. Os demais livros são ignorados neste momento; o pintor os situa às costas do monge. Todos os demais livros estão fechados, e apenas a Bíblia está aberta. A impressão que se tem, quando se observa o olhar e a postura corporal, é que Lutero experimenta uma ambivalência: uma surpresa que ao mesmo tempo o atrai e também o assusta. Tal ambivalência coloca-o na posição tensa entre o aproximar-se ou não da letra e do espírito daquele livro. Inevitavelmente, em algum momento essa tensão terá que ser resolvida, em uma direção ou outra.
Confira ainda: 1) O jovem Lutero canta diante da senhora Ursula Cotta em Eisenach – Ferdinand Pauwels, 2) Amigo de Lutero atingido por um raio – Ferdinand Pauwels, 3) A Entrada de Lutero no Mosteiro – Ferdinand Pauwels; 4) Martinho Lutero Descobrindo a Justificação pela Fé – Edward Matthew Ward e 5) Erasmo, Lutero e o “Livre Arbítrio”. Recomendo ainda a leitura de “Os 500 anos da Reforma Protestante, que abalou o mundo”, pela jornalista Míriam Leitão, aqui.