“É necessário amar o avô!” – Eça de Queirós
O velho correu, logo; e daí a pouco aparecia, erguendo nos braços o pequeno, na sua longa capa branca de franjas e sua touca de rendas. Era gordo, de olhos muito negros, com uma adorável bochecha fresca e cor-de-rosa. Todo ele ria, grulhando, agitando o seu guizo de prata.
A ama não passou da porta, tristonha, com os olhos no tapete e uma trouxazinha na mão.
Afonso sentou-se lentamente em sua poltrona, e acomodou o neto no colo. Os olhos enchiam-se-lhe de uma bela luz de ternura; parecia esquecer a agonia do filho, a vergonha doméstica; agora só havia ali aquela facezinha tenra, que se lhe babava nos braços…
― Como se chama ele?
― Carlos Eduardo ― murmurou a ama.
― Carlos Eduardo, hein?
Ficou a olhá-lo muito tempo, como procurando nele os sinais da sua raça; depois tomou-lhe na sua as duas mãozinhas vermelhas que não largavam o guizo e, muito grave, como se a criança o percebesse, disse-lhe:
― Olha bem para mim. Eu sou o avô. É necessário amar o avô!
E àquela voz, o pequeno, com efeito, abriu os seus lindos olhos para ele, sérios de repente, muito fixos, sem medo das barbas grisalhas: depois rompeu a pular-lhe nos braços, desprendeu a mãozinha, e martelou-lhe furiosamente a cabeça com o guizo.
Toda a face do velho sorria àquela viçosa alegria; apertou-o ao seu largo peito muito tempo, pôs-lhe na face um beijo longo, consolado, enternecido, o seu primeiro beijo de avô; depois, com todo o cuidado, foi colocá-lo nos braços da ama.
(Eça de Queirós. In: Os Maias. Rio de Janeiro: Ediouro, 2004, pp. 56-57. E-book aqui)
Le grand-père, 1895, Georges Maroniez (French painter, 1865-1933), Oil on canvas, 66 × 89.5 cm, Chi Mei Museum Tainan, Taiwan